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Patrimônios espanhóis: Reino das Astúrias

No ano passado, começamos uma nova série no blog da Cultura Espanhola em que apresentamos locais e monumentos ao redor da Espanha que, por causa de seu valor artístico, arquitetônico e/ou histórico, são considerados patrimônios da humanidade pela UNESCO.

Assim, seguindo com nossa lista vamos hoje até as Astúrias, comunidade no norte da Espanha que desempenhou um papel fundamental para a Reconquista Cristã na Península Ibérica. Tais pegadas ainda são visíveis nos dias atuais e foram imortalizadas na lista de patrimônios da UNESCO sob a denominação “Monumentos de Oviedo e do Reino das Astúrias”.

Vamos, então, conhecer mais sobre eles.

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Astúrias: a semente da Reconquista

O Principado das Astúrias (Principado de Asturias) é uma comunidade autônoma derivada do antigo Reino das Astúrias e localizada na região noroeste da Espanha, fazendo fronteira com as comunidades da Galiza (Galicia), Cantábria (Cantabria) e Castela e Leão (Castilla y León). Atualmente ocupa uma área de aproximadamente 10.600 km², embora no seu apogeu tenha abarcado mais de 60 mil km² de extensão.

Bem no início da Idade Média, o território que hoje corresponde à Espanha e partes de Portugal se organizava em torno do Reino Visigodo de Toledo. Já a região das Astúrias era habitada pelos astures, povo de ascendência celta que chegou a ter suas terras sob domínio romano, mas nunca foram totalmente integrados ao Império. Com a queda de Roma, houve uma nova tentativa, desta vez visigótica, de controlar o território, mas os astures foram capazes de resistir à invasão.

Patrimônios espanhóis: Reino das Astúrias

arateman via Wikimedia Commons

Tempos depois, além de não terem sido bem-sucedidos em sua campanha militar nas Astúrias, o Reino Visigodo de Toledo eventualmente caiu para as tropas mouras em 711 (este período de invasão e expansão muçulmana ficou conhecido como Al-Andalus e já foi tratado em outros textos como este aqui).

Assim como ocorreu com os romanos e os visigodos, os muçulmanos também tentaram anexar o território dos astures e enfrentaram uma ferrenha resistência. No final, não somente a região das Astúrias logrou manter sua independência como também se tornou a única parte da Península Ibérica a permanecer fora do controle muçulmano. Uma data particularmente importante é o ano de 718 quando o líder militar don Pelayo, após sua vitória na Batalha de Covadonga, foi proclamado monarca do Reino das Astúrias (alguns acreditam que a batalha em si possa ter acontecido em 720).

Tendo em vista o ânimo alcançado pelo então êxito militar bem como a forte devoção cristã de sua população e seus líderes, o Reino das Astúrias começou a se organizar de maneira mais intensa com o objetivo de recuperar as demais terras da Península Ibérica que foram perdidas para os muçulmanos. Este momento foi crucial para a história da Espanha, pois marcou oficialmente o início da Reconquista Cristã, a qual se estendeu até o ano de 1492 já sob o reinado de Isabel de Castela e Fernando de Aragão.

O Reino das Astúrias, por sua vez, deixou de existir em 924 quando se fundiu ao Reino de Leão (León), sendo que este foi posteriormente aglutinado ao Reino de Castela (Castilla) em 1230. Apesar de seu fim ter ocorrido muito tempo antes da queda de Granada para os Reis Católicos, a influência do Reino das Astúrias para a obtenção deste feito é inegável.

Monumentos e principais características

Como a região das Astúrias permaneceu separada do restante de Al-Andalus, suas manifestações culturais e artísticas se diferenciaram consideravelmente de outras partes da Espanha. Especificamente durante o século IX, o território desenvolveu um estilo arquitetônico inovador que mais tarde seria chamado de pré-românico asturiano (o estilo pré-românico foi o primeiro a surgir na Europa Ocidental durante a Idade Média, sendo mais tarde substituído pelo românico e, por fim, o gótico).

Patrimônios espanhóis: Reino das Astúrias

Ángel M. Felicísimo via Wikimedia Commons

No caso do pré-românico asturiano, a maioria das estruturas ainda existentes são templos religiosos e detém características únicas que as fazem exemplos singulares da antiga civilização asture. Dentre elas, os monumentos que fazem parte da lista da UNESCO são:

  • Santa María del Naranco: antigo palácio do rei Ramiro I. Foi transformada em igreja no século XII, mas alguns estudiosos acreditam que seu propósito original era servir como um mausoléu

  • San Miguel de Lillo: distante há poucos metros de Santa María del Naranco. Ao contrário da primeira, essa sim foi construída desde o seu início para ser uma igreja que foi dedicada a São Miguel Arcanjo

  • Santa Cristina de Lena: outra igreja da época de Ramiro I, situa-se em uma colina no município de Lena, o qual faz fronteira com a província de León. Construída no século IX, essa igreja “se perdeu” no tempo até que foi redescoberta por Gaspar Melchor de Jovellanos em 1793, responsável por divulgá-la ao grande público

  • San Julián de los Prados: basílica localizada em Oviedo e construída no reinado de Alfonso II em honra aos mártires Santo Julião e Santa Basilissa. Seu principal atrativo é o conjunto de pinturas (decoração pictórica) que utiliza técnicas semelhantes à arte bizantina

  • Cámara Santa de Oviedo: parte da atual Catedral de Oviedo, é composta por duas capelas: uma cripta inferior denominada Capilla de Santa Leocadia e a Capilla de San Miguel na parte superior. Nesta última, destaca-se também a exibição de importantes relíquias para o cristianismo asturiano como a Cruz de la Victoria, lendariamente usada por Don Pelayo na Batalha de Covadonga e símbolo até hoje do Principado das Astúrias

  • Foncalada: fonte de água potável em Oviedo erguida durante o reinado de Alfonso III. Sua importância está no fato de ser o único vestígio de uma estrutura de utilidade pública de estilo pré-românico asturiano que ainda se conserva até os dias atuais]

Patrimônios espanhóis: Reino das Astúrias

Michel Curi via Wikimedia Commons

 

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Processo de admissão na UNESCO

Tendo em vista que estes monumentos são a materialização de um importante período histórico não somente para a Espanha como também para todo o panorama europeu ocidental, houve um grande interesse de que a arte pré-românica asturiana recebesse o devido reconhecimento dentre os patrimônios da humanidade da UNESCO.

Tal adesão foi concretizada em 1985, contando com uma pequena ampliação para alguns monumentos em 1998. Vale mencionar que desde 2007 se pleiteia a adição da igreja San Salvador de Valdediós, então é possível que novas alterações ocorram futuramente.

Patrimônios espanhóis: Reino das Astúrias

Siestecita via Wikimedia Commons

De acordo com a organização, os “Monumentos de Oviedo e do Reino das Astúrias” se caracterizam como patrimônios da humanidade por terem exitosamente atendido aos seguintes critérios:

Critério (i): a arquitetura pré-românica asturiana representa uma realização artística única que não é nem uma metamorfose da arte paleocristã nem uma característica da arte carolíngia. Estas igrejas de planta basilical, inteiramente abobadadas e que utilizam colunas em vez de pilares, apresentam riquíssimas decorações

Critério (ii): os monumentos asturianos exerceram uma influência decisiva no desenvolvimento da arquitetura medieval na Península Ibérica

Critério (iv): os palácios e igrejas nos arredores de Oviedo constituem um testemunho eminente da civilização do pequeno Reino cristão das Astúrias7

Leia também: Patrimônios espanhóis: El Escorial

Vídeo UNESCO/NHK: Monumentos de Oviedo y del reino de Asturias

Ficou curioso em saber mais sobre esta arte tão única? Então confira no vídeo abaixo mais informações sobre estes icônicos monumentos que para sempre farão parte da história e memória das Astúrias, da Espanha e de toda a humanidade:

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Esperamos que tenha gostado do texto de hoje e de conhecer mais sobre este breve, mas tão importante reino. Nos vemos na próxima semana!

¡Abrazos!

Esther Fuentes
Esther Fuentes