Todos sabemos que onde há dinheiro também há pobreza, e que existem pessoas que lutam para fazer a diferença e tirar os menos favorecidos das ruas. Sendo assim, surgiu na Espanha uma ONG focada em ajudar os moradores de rua.
O que a ONG faz?
A resposta é simples e inovadora. Na maioria das vezes os cartazes de moradores de rua são completamente ignorados por aqueles que os veem. Porém essa ONG que surgiu em Barcelona tem trazido as fontes dos cartazes para os holofotes, levando-as para o mundo digital.
O programa se chama “Homelessfonts” e foi uma iniciativa da Arrels Fundació, que passou a digitalizar as letras das pessoas que vivem nas ruas e torná-las fontes tipográficas, com o intuito de vende-las na internet. O dinheiro que eles arrecadam é inteiramente revertido para ajudar os moradores de rua, como o homem hispano-brasileiro Francisco Javier Cáceres Serrano de 63 anos.
Este homem é um dos 10 autores de fontes do projeto, que tem como principal objetivo ajudar os moradores de rua e chamar a atenção do mundo para essa causa que é tão importante. Também foi feita uma campanha nas redes sociais onde a fundação utiliza a hashtag “#ningúdormintalcarrer”, que significa “#ninguémdormindonarua).
Um pouco de Francisco
“A letra é muito pessoal, muito particular, tanto que ela é usada até em investigações criminais”, disse Francisco. “Se minha letra pode ajudar a divulgar a situação de pessoas que vivem na rua, acho que é muito positivo participar”.
A história da vida de Francisco tem servido de exemplo para as pessoas que compram sua letra e que também conhecem sua trajetória, incluindo os jovens que frequentam as escolas onde ele faz palestras sobre sua vida e também sobres os riscos de cair na rua.
Ele nasceu em Barcelona e chegou no Brasil com 2 anos de idade, onde passou 52 anos em São Paulo e lá teve três filhos. Sendo artista plástico e gráfico, ele nos conta que teve uma carreira artística e dá como exemplo ter sido um dos fundadores da Associação dos Artistas Plásticos de Colagem de São Paulo na década de 70.
Já era divorciado e tinha seus filhos criados quando decidiu ir para Barcelona conhecer o lugar onde nasceu. Tinha o sonho de montar um ateliê no local, mas se frustrou assim que chegou cinco anos atrás. Aquela foi a primeira vez que visitou o país, e nisso, a companhia aérea perdeu sua mala e logo em seguida foi roubado. Ficando sem dinheiro, sem documentos e sem nenhum laço familiar por perto passou por muitas dificuldades, e assim viveu nas ruas de Barcelona por um ano e meio.
Os corações bondosos de Barcelona
Francisco relata que teve de dormir em uma loja contando com a solidariedade do dono do local que até hoje é amigo dele. “Ninguém sabia que eu vivia na rua. Aqui na Arrels, só souberam quando eu abri o jogo. Nunca andei carregado de coisas.” Diz Francisco.
“Também não permiti que meus filhos soubessem da minha situação, só falei quando saí da rua. Eles ficaram com muita raiva porque não contei. Mas se eu contasse, eles teriam vindo me buscar, e eu não queria voltar para o Brasil naquele momento”. Explica Francisco.
Ele conta que se sentia atraído pela arte, a história da arquitetura e a antiguidade da cidade. “Eu me sento em um parque aqui que é mais velho que o Brasil.” “É claro que sinto saudade do Brasil”, enfatiza o ex morador de rua ao ser entrevistado pela BBC Brasil, e complementa dizendo: “A vida lá é melhor que aqui, não no âmbito econômico, mas social. O brasileiro é mais solidário, mais amigo. É claro que tenho saudade do Brasil.”
A volta por cima
Nos dias de hoje, Francisco vive em uma pensão e colabora com o departamento de comunicação da ONG. Afirma que daquela época difícil, aprendeu a ser mais humilde, e hoje aposta que as iniciativas como a do #Homelessfonts podem ajudar e dar visibilidade as pessoas sem lar.
“Foi uma experiência ruim e ao mesmo tempo positiva, porque me transformou em uma pessoa melhor. Hoje me preocupo com as coisas que nunca antes na minha vida prestei atenção”, comenta e completa dizendo “No grupo, havia quatro artistas. As pessoas pensam que os caras que estão na rua são ignorantes, burros. Eu conheci médico, advogado e economista que viveram na rua. Eu mesmo sou formado e vivi na rua. Pode acontecer com qualquer um. É muito mais fácil cair do que levantar.”